quarta-feira, 26 de maio de 2010

O AQUECIMENTO GLOBAL E O SEMIÁRIDO NORDESTINO

O consumismo desenfreado da sociedade moderna, exacerbado a partir da Revolução Industrial, desponta como uma das causas mais importantes da intensificação do efeito estufa e conseqüente aquecimento global. Isto porque a produção de bens de consumo para atender esta demanda vem incrementando a matriz energética global fundamentada na queima de combustíveis fósseis, com crescentes emissões de dióxido de carbono e outros gases, opacos às perdas da radiação emitida pela terra, o que está resultando no aumento gradual da temperatura média do planeta. A isto se some os bilhões de toneladas do gás lançados na atmosfera pelos meios de transporte e pelas queimadas dos países ditos do terceiro mundo. Estima-se em 25 bilhões de toneladas a produção anual de dióxido de carbono pela atividade humana.

Em termos globais, nas próximas décadas deverão ocorrer significativos aumentos da temperatura média do planeta, do nível do mar, da aridez, da frequência e intensidade de furacões e tufões, da ocorrência de pandemias, descongelamento das geleiras e das calotas polares, nova glaciação, escassez de água e de alimentos e aumento da pobreza e da população faminta. As consequências resultantes poderão ter efeitos devastadores sobre a biodiversidade e sobre a sociedade humana.

Mesmo se medidas de urgente mitigação forem tomadas em nível mundial, por volta do fim deste século, a temperatura média da Terra deverá subir até 3 0C, e o nível dos oceanos aumentará cerca de 1,5 m. Isto significará mudanças profundas nos atuais modelos de vida da sociedade humana no planeta, destacando-se a ocorrência de maciços êxodos das populações dos países da Oceania, alterações substanciais na paisagem das cidades litorâneas.

A vasta região do semiárido brasileiro não ficará imune a estes efeitos perversos. As atividades da agricultura das queimadas, do sobrepastejo e da extração de lenha predatória e desregrada ao longo dos três últimos séculos, aceleraram a marcha da degradação e desertificação, fragilizando os ecossistemas e induzindo elevadas perdas em sua resistência. Assim, o impacto das mudanças climáticas nos sertões nordestinos, será igualmente devastador.

Especificamente, segundo previsões fundamentadas em estudos recentes, o futuro reserva para os sertões nordestinos aumentos significativos da temperatura, da evapotranspiração e redução dos índices pluviométricos com o aumento da aridez, transformando o que se conhece como Semiárido Nordestino em uma imensa região árida. Os resultados serão: a inviabilização da agricultura, da pecuária e da extração de madeira nos moldes das atuais práticas. Diversas culturas, tais como, o milho, o algodão, o feijão e a mandioca terão suas áreas de cultivo drasticamente reduzidas, a pecuária bovina deverá ser substituída pela de pequenos ruminantes e os estoques madeireiros poderão finalmente atingir a exaustão.

Mas, que medidas em nível da convivência poderão ser tomadas?

Responder esta pergunta é, nas atuais circunstâncias, difícil, mas, por outro lado, a busca de possíveis respostas é de urgência prioritária. A implementação e continuidade das ações propostas pelo PAE, Plano Estadual de Combate à Desertificação, servem de ótimos roteiros. Assim, algumas sugestões podem ser apresentadas. Em primeiro lugar, o manejo racional e sustentável dos recursos hídricos constitui a condição sine qua non. Ênfase especial deve ser dada às práticas de captação in loco, tais como, intensificação da construção de cisternas domésticas e das cisternas-calçadão, de barreiros da salvação, de barragens subterrâneas, de barramentos sucessivos e de sulcos e depressões nos campos agrícolas. A recomposição florestal das extensas áreas da Caatinga degradadas, com base em espécies arbóreas e arbustivas xerófilas nativas e exóticas adaptáveis, bem como a reposição das matas ciliares, são medidas de premência a serem tomadas para proteção do solo contra a erosão, recuperação dos habitats, proteção dos mananciais e funcionamento dos ecossistemas fragilizados.

No que tange à agricultura, mudanças de cultivos e das práticas em uso, devem ser incrementadas. Em substituição, parcial em alguns casos e total em outros, das atuais culturas, sorgo, milheto, e guandu são apontados como excelentes alternativas. Estas culturas já constituem o trivial de muitas regiões áridas da Terra e institutos de pesquisa como o ICRISAT (Instituto Internacional de Pesquisa Agrícola para Regiões Tropicais Semiáridas) disponibilizam excelentes bancos de sementes selecionadas. No tocante às práticas, a Agrossilvicultura poderá oferecer modelos de sistemas de produção sustentáveis, para as condições áridas e semiáridas. A Embrapa Caprinos, em Sobral, desenvolveu o SAF-Sobral, um modelo de sistema de produção agrossilvipastoril que ao longo de 12 anos tem provado ser uma opção excelente para as condições do sertão nordestino.

Para a pecuária, a base alimentar, mais do que nunca, deverá fundamentar-se no uso sustentável do inestimável patrimônio florístico da Caatinga. Técnica de manipulação da vegetação da Caatinga para fins pastoris, tais como, rebaixamento, raleamento e enriquecimento já têm o aval da pesquisa e dos testes em meio real. Estas tecnologias têm provado ser economicamente viáveis, de fácil implantação e sustentáveis em longo prazo. Ovinos, bovinos e caprinos, em pastoreio solteiro ou combinado, em operações de cria, recria e acabamento já foram testados e mostraram ser viáveis.

Muitas outras alternativas de mitigação dos impactos do aquecimento global nos Semiárido Nordestino estão disponíveis. O que se espera é, acima de tudo, a vontade política de sua implementação.

João Ambrósio de Araújo Filho

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Quem sou eu

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Nasci em Massapê/Ceará.Filha de uma família de 13 irmãos/ãs, sendo a caçula.Trabalhei na agricultura e na pesca artesanal do camarão. Fui alfabetizada aos 10 anos de idade e, encantei-me com a arte de aprender. Sou graduada em História e curso Direito; tenho um filho. Entrei no movimento sindical rural com 16 anos de idade. Em 1998 assumi a secretaria municipal de mulheres do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Massapê, ficando até início de 2002.Em 1999 filiei-me ao PT.Fui assessora parlamentar.Eleita conselheira tutelar; fui bolsista da Fundação Carlos Chagas – SP, para trabalhar com grupos de jovens.Estagiária do SOS Corpo - organização feminista de Recife-PE.Desde 2002 passei para a coordenação executiva do CEAT – Centro de Estudos e Apoio ao Trabalhador e à Trabalhadora, com sede em Sobral e atuação em 39 municípios do Ceará, que tem como principal foco a convivência com o semiárido, permanecendo até os dias atuais.Tenho orgulho de Coordenar, na região Norte do Ceará, um dos principais programas sociais–Programa Um Milhão de Cisternas–que viabiliza água potável para as famílias agricultoras que moram em comunidades rurais.